/Por Daniel Salles
Carlo DeVito é um americano grandalhão que, acompanhado da mulher, Dominique, e dos filhos gêmeos do casal.
Se mudou de New Jersey para o norte de Nova York em 2006.
Trocou de ares para fundar, numa cidade chamada Ghent, a vinícola Hudson-Chatham, que produz rótulos com uvas bem conhecidas, como merlot e cabernet franc.
Não quer dizer que ele torça o nariz para vinhos fora do óbvio. Pelo contrário.
Adora garimpá-los e promover os que julga excepcionais. É o caso do tinto Oak Dry produzido pela Bartlett, situada na costa do Maine.
Certa vez, para comprovar a qualidade da bebida, DeVito chamou os familiares, incluindo o cunhado, partidário fervoroso dos vinhos italianos, para uma degustação de Tignanello, um dos rótulos mais aclamados da Toscana.
Lá pelas tantas, sem que ninguém visse, encheu as taças com o Oak Dry.
“Todo mundo adorou”, lembra. “É um tinto fabuloso, tem o mesmo gosto dos Chianti.” Nada mau para um vinho feito de mirtilo, o blueberry.
Um toque a mais
Envelhecido em barris de carvalho, o tinto da Bartlett é um dos melhores representantes da nova geração dos vinhos que não levam nem um pingo de uva.
Não é conversa de quem bebeu demais.
E está longe de ser novidade: a primeira poção alcoólica foi preparada na China, por volta do ano 8000 a.C., numa mistura de arroz, mel, uvas e um tipo de cereja.

Com todo o direito, a uva ganhou os holofotes, mas maçãs, cerejas e companhia também cumprem a função.
No caso dessas últimas, a tradição é caprichar no açúcar para garantir o dulçor e aumentar o teor alcoólico.
É o que explica a má fama dos vinhos sem uva, vamos chamá-los assim.
Em geral rudimentares, sem nenhuma complexidade, e não raro intragáveis, também costumam ser classificados como fermentados.
Você já deve ter experimentado – e achado terrível – algum representante brasileiro, provavelmente de jabuticaba, produzido em Minas Gerais.
A Dinamarca se notabilizou por desenvolver vinhos de maçã reputados e o Japão é conhecido por elaborar variedades com ameixa.
É nos Estados Unidos, no entanto, sobretudo no estado do Maine, que estão concentrados os produtores mais elogiados.
Michael Terrien e Eric Martin, por exemplo.
Amigos de infância, eles se associaram em 2014 para fundar a marca Bluet. Também com mirtilo como matéria-prima, a dupla produz dois espumantes.
Um deles, feito em pequenas quantidades, segue o método champenoise – vendido a 33 dólares, ostenta a mesma roupagem que um Taittinger ou um Dom Pérignon.
O segundo rótulo, comercializado a 20 dólares, é elaborado da mesma forma que os Proseccos, pelo método charmat.
“São espumantes complexos, dignos de ser envelhecidos, e com baixo teor alcoólico”, Terrien explica. “Evocam a acidez e a mineralidade dos champanhes e expressam as características únicas dos mirtilos selvagens e do terroir do Maine.”
Uma salada mista
Em 1974, quando Edward O’Keefe Jr. fundou o Chateau Grand Traverse, no norte do Michigan, seu objetivo era produzir rieslings que ombreassem com os melhores do mundo.
Com o passar dos anos, também passou a plantar chardonnay, pinot gris, gewürztraminer e pinot noir, entre outras uvas.
No fim daquela década, lançou uma linha de vinhos à base de cereja, hoje composta de seis rótulos, um deles no estilo seco, outro no demi sec e um com riesling na receita.
É uma homenagem às famosas tortas de cereja do Michigan, também tradicional fornecedor de vinhos com a fruta.
Donos da Chestnut Run Farm, que produz peras em New Jersey desde 1986, além de maçãs e ameixas, Lise Clark e Bob, seu marido, transformam tudo o que colhem em vinho desde 2006.
A decisão se deve à competição cada vez mais acirrada que precisaram travar com grandes produtores de frutas e ao sucesso dos vinhos sem uva. “Só colhemos quando a maturação chegou à perfeição”, explica Lise.
Para produzir três de seus vinhos de maior sucesso, dois brancos e o espumante Hula O Maui, a vinícola MauiWine descasca a cada ano mais de 27 toneladas de abacaxi.
Localizada no Havaí, a propriedade também engarrafa tintos com uvas syrah, grenache e malbec, entre outras.
Em 1974, no ano de sua fundação, elegeu o abacaxi para testar um método de produção de espumantes.
Foi o que bastou para promoverem a fruta à matéria-prima e fazerem dela o símbolo da vinícola.
Salada de frutas
Quais são os principais representantes que criaram a categoria de vinhos sem uva:
