/ Por Tânia Nogueira
O rótulo mais caro da nova e badalada região vinícola do Sudeste brasileiro é, quem diria, um varietal de cabernet franc.
Em fevereiro, a Vinícola Guaspari, no interior de São Paulo, lançou o Guaspari Cabernet Franc 2015, um vinho bastante complexo, que custa 548 reais e só é vendido no site ou na loja da bodega (que está temporariamente fechada).

Em várias regiões do mundo tem aparecido exemplares bastante interessantes dessa casta, que por muitas décadas desempenhou papel de coadjuvante. Mas, ao que parece, descobriram o potencial e quão elegante pode ser o produto dessa uva. “O cabernet franc está se destacando no mundo todo”, diz o californiano Gustavo Gonzalez, diretor de enologia da Guaspari.
Menos encorpado do que o cabernet sauvignon, o varietal de cabernet franc costuma ter boa estrutura, mas com taninos mais finos e uma acidez bem marcante. Por isso, é um vinho bastante gastronômico, ótimo para acompanhar comida, inclusive molhos vermelhos.
Os aromas são da mesma família dos encontrados no cabernet sauvignon: frutas vermelhas e escuras, pimentão, pimenta. Mas as frutas são mais azedinhas e o pimentão, menos verde.
A elegância tem muito a ver com maturação. “A cabernet franc tem um ciclo mais curto que a sauvignon. Por isso, costuma ser mais fácil atingir a maturação fenólica”, diz Gonzalez. Ou seja, é menos provável que ela seja colhida antes da hora.
O PEDIGREE DA UVA
Segundo o guia de uvas viníferas Wine Grapes, escrito por Jancis Robinson, Julia Harding e José Vouillamoz, testes de DNA provam que a cabernet franc tem origem no País Basco, ao norte da Espanha, e que muito cedo se espalhou pelo sudoeste francês, chegando logo a Bordeaux – onde é uma uva bastante tradicional.

A cabernet sauvignon, a grande casta bordalesa, por exemplo, nasceu de um cruzamento de cabernet franc com a sauvignon blanc. A primeira menção histórica ao vinho produzido por essa casta, no entanto, aconteceu apenas em 1534, na série de livros de François Rabelais Gargântua e Pantagruel, já se referindo aos tintos do Vale do Loire.
Na maior parte da França e do mundo, a cabernet franc é usada para fazer vinhos de corte. É assim em Bordeaux, onde, apesar de muita gente não saber, ela é tão importante quanto a merlot e a cabernet sauvignon.
CONQUISTA MUNDIAL
Na Itália, a cabernet franc tem protagonismo em varietais, especialmente em Bolgheri, na região da Toscana. Com um oceano de distância, as regiões americanas de Sierra Foothills, na Califórnia, e Finger Lakes, no estado de Nova York, também estão investindo na casta.
No Brasil, ela se dá muito bem em várias localizações. “Na Manti- queira, com a poda invertida, ela completa o ciclo de maturação antes de agosto, quando as temperaturas começam a subir e a amplitude térmica diminui”, explica Gonzalez. A delicadeza e o desenvolvimento dos aromas dependem muito da alternância de temperaturas elevadas e baixas, entre dia e noite, que costuma se chamar de amplitude térmica.
No Rio Grande do Sul, a casta já foi muito plantada, mas foi substituída pela cabernet sauvignon. “Era conhecida simplesmente como cabernet”, conta Daniel Salvador, presidente da Associação Brasileira de Enologia (ABE) e sócio da Vinícola Salvattore, em Flores da Cunha, na Serra Gaúcha. “A cabernet franc está sendo retomada aos poucos.”

Alain de la Treille 2018
VALE DO LOIRE | FRA
Delicado, tem aromas de groselha e frutas vermelhas e um surpreendente floral que lembra rosas secas. Leva a denominação Vin de France, e não Vale do Loire, apenas pela juventude das vinhas. Não passa por madeira. 76 reais, na Sociedade da Mesa.