/Por Tânia Nogueira
Muita gente pode não estar preparada para isso, mas o vinho em lata veio para ficar. É a grande tendência que vem da Califórnia. Tudo começou em 2004, quando a Francis Ford Coppola lançou o espumante Sofia Blanc de Blancs em lata. Apesar de a vinícola do famoso diretor de cinema ter prestígio, na época muita gente torceu o nariz para a novidade.
Porém, aos poucos, as pessoas foram se acostumando com a ideia e surgiram novos lançamentos, não só na Califórnia, mas no mundo todo. Tanto que, em 2019, foi criado um concurso só para vinhos em lata, o International Canned Wine Competition.
Na edição de 2020, o concurso recebeu 226 amostras de 70 produtores de 16 países diferentes. Dois brasileiros saíram premiados. A Vivant recebeu uma medalha de ouro pelo design da série de suas latas e a Arya três medalhas de ouro por seus vinhos tinto, branco e prosecco. “O rosé não deu tempo de mandar”, diz Daniel Gambardelli, sócio da DistillRuptive, empresa que, além dos quatro rótulos do Arya, produz drinques enlatados.
Foi uma bela estréia. Gambardelli e o sócio, Diego Aimore, lançaram o Arya em março deste ano, em plena pandemia. “Em outubro do ano passado, quando a gente ainda estava finalizando a receita do Bakko (marca de drinques em lata), a gente começou a ver um movimento de vinho em lata crescendo muito lá fora.
Pensávamos em um dia fazer um vinho em lata, mas vimos que ou a gente lançava agora ou perderíamos o timing. Aí, fomos atrás do melhor sommelier do Brasil, o Diego Arrebola, três vezes campeão, para nos ajudar a criar o produto e orientar a produção que seria feita no Rio Grande do Sul.” Foi um sucesso. O primeiro lote vinho, que é feito em Caxias do Sul, foi produzido com a safra 2019. Esgotou. Todos os 10 mil litros produzidos foram vendidos. Agora eles já estão lançando a safra 2020. “Produzimos um lote maior”.
Como um produto para balada conseguiu se dar bem em tempos de isolamento social? “O Arya não é só para a balada”, diz Gambardelli. “Não queremos definir perfil do consumidor nem situação de consumo. É um vinho para todo mundo”. Por que em lata? “A lata é o vasilhame mais sustentável do mundo”, diz ele.
“A taxa de reciclagem do vidro no Brasil é de 30% a 40%. A da lata é 97%. Vidro é 100% reciclável também, mas existe uma diferença entre o que é reciclável e o que é efetivamente reciclado. O prazo médio que uma lata demora para voltar para a linha de produção é de 90 dias. A escolha da lata foi por uma questão de sustentabilidade”.
Segundo Diego Arrebola, a lata não interfere com as características organolépticas do vinho. “São latas específicas para bebidas com pH mais baixo, revestidas internamente por um polímero que impede o contato direto do vinho com o alumínio”, diz Arrebola. O sommelier foi responsável pelas assemblages dos quatro vinhos, ou seja, foi ele quem decidiu pelo corte de pinot noir e rebo para a safra 2019 do tinto, por exemplo.
“A rebo produz vinhos retintos, muito frutados, com acidez suculenta e marcante e taninos marcados porém macios e educados, lembrando castas como a vinhão, a teroldego e a barbera”, diz Arrebola. “Ela me entrega características aromáticas e de sabor que julgo adaptadas a proposta do vinho em lata, entregando esse frescor e fruta intensa, pensando em um vinho que será muitas vezes consumido diretamente na lata e precisa, portanto, ter muita presença de boca. A pinot em 2019 entrou, para ‘domar’ a rebo, dando mais elegância e delicadeza ao resultado final.”
“A safra 2020 já é um corte de pinot noir, merlot e, apenas, cerca de 10% de rebo. A rebo foi usada em menor quantidade unicamente porque temos volumes maiores de produção e não havia disponibilidade de tanta rebo no Brasil. Mas os vinhos da excelente safra 2020 nos permitiram alcançar um resultado tão bom quanto, senão superior, ao de 2019”, completa.